Reforma tributária: análise das estratégias propostas



A movimentação de bastidores do governo, incluindo Câmara e Senado, indica que o assunto volta à pauta com força nos próximos dias. A ideia de fatiar a reforma tributária, defendida pelo ministro Paulo Guedes, ganha força com a adesão do legislativo, que está propondo, inclusive, que algumas temáticas sejam apreciadas a partir de projetos de lei cuja sistemática de tramitação é menos complexa do que uma proposta de emenda constitucional.

Com relação ao foco central das reformas, não resta dúvida que a simplificação tributária deve ser buscada como forma de minimizar o peso adicional que os tributos trazem para as forças produtivas do país, componente importante do chamado “custo Brasil”, ao adicionar tamanha complexidade ao cumprimento dessas obrigações. Por outro lado, não se faz uma reforma tributária decente sem se preocupar também com a qualidade da tributação, ou seja, temos que, urgentemente, mudar nosso perfil tributário da regressividade para a progressividade.

Tributação progressiva

Todos os países que apresentam melhores índices de distribuição de renda, medida pelo índice de Gini, ou até mesmo níveis mais elevados de IDH, possuem em comum uma tributação majoritariamente progressiva, com, em média, 60% da arrecadação vinda da tributação direta e 40% da tributação indireta. No Brasil, ocorre exatamente o oposto.

Enquanto a tributação progressiva leva em conta a capacidade contributiva, cobrando mais de quem tem maior renda e menos ou nada de quem tem menor renda, a tributação regressiva trata a todos da mesma forma. Como exemplo de tributo que permite a progressividade, temos o imposto sobre a renda e proventos de qualquer natureza, e como exemplos de tributos regressivos, os que incidem sobre o consumo.

Puxando a brasa para a minha sardinha, cito como exemplo de progressividade o Imposto de Renda da Pessoa Física, cuja tabela, que ainda pode ser bastante melhorada, já apresenta degraus de tributação, conforme a renda. Ainda assim, apresenta graves distorções em seus extremos: na primeira faixa da tabela, agravada pela ausência de correção de valores desde 2015, a tributação tem sido aumentada a cada ano sem atualização; na outra ponta, há espaço para uma tributação mais elevada em faixas maiores.

Mas a mais grave distorção vem da não tributação de lucros e dividendos, vigente desde janeiro de 1996, que faz com que as mais altas rendas do país tenham tributação média pelo imposto de renda de apenas 6%, enquanto a classe média, e aqui não uso estatística, mas a minha tributação pelo IRPF, que é, efetiva, de 21%.

Propostas reforma tributária

Antes de encerramos, para que não sobre um excessivo gosto de quero mais, listamos algumas propostas que serão discutidas, entre outras que poderão surgir dentro do processo de apreciação dos projetos.

A primeira é a proposta que extingue e funde o PIS e a COFINS, criando a CBS (Contribuição Social sobre Operações com Bens e Serviços), com o objetivo de simplificação do recolhimento, maior transparência e até destaque na nota fiscal.

Na seara do imposto de renda, na pessoa física, finalmente deverá ocorrer a atualização da tabela, mas sem mudança nas faixas de tributação,
permanecendo a mais alta em 27,5%. E a maior e mais esperada mudança virá da proposta de tributação dos lucros e dividendos, cuja discussão se inicia com alíquotas de 15% ou 20%.

Já no Imposto de Renda da Pessoa Jurídica, para compensar a tributação dos lucros distribuídos, a proposta prevê que a alíquota caia dos atuais 15% para 10%, com o primeiro ano de vigência em 12,5%.

Ainda relacionada ao imposto de renda, existe a proposta de se eliminar a tributação regressiva em relação ao prazo das operações de renda fixa, que hoje começa com 22,5% nas operações de curto prazo e chega a 15% para as operações com prazo superior a 720 dias.

A proposta é que a tributação seja de 15%, independentemente do prazo. E, por último, existem propostas de se eliminar as isenções hoje existentes para os investimentos em Certificados de Recebíveis Imobiliários (CRI) e em Certificados de Recebíveis Agrícolas (CRA) e fundos exclusivos.

Já a malvista proposta de instituição de um “imposto de transações”, que, independentemente da nomenclatura que venha a ter, nos remeterá à lembrança da malfadada CPMF, não deverá partir do executivo, especialmente com a impopularidade da medida e a proximidade com o calendário eleitoral. Talvez a indigesta proposta venha do legislativo.

De qualquer forma, continuamos na torcida para que as análises técnicas prevaleçam sobre as questões políticas, tarefa hercúlea com 2022 batendo na porta.

Fonte: Portal Contábeis