Roubo de mercadorias: tributar por quê?
Sabemos que o Brasil é um dos países que possui uma carga tributária das mais altas no mundo. Isso, porque, sem dúvidas, é o país onde existe mais tributos. Quem sofre com a alta carga tributária são os contribuintes que figuram no polo passivo das relações com os órgãos arrecadadores. Um fardo bem pesado de obrigações.
As operações de saída dos produtos que são fabricados pelas indústrias e das operações de revenda de mercadorias praticadas pelo comércio atacadista, distribuidor e varejista, o fato gerador do IPI e do ICMS, regra geral, é, justamente, a saída do produto/mercadoria do estabelecimento industrial ou comercial. Não bastasse a perda das mercadorias, o contribuinte ainda assim tem que tributar o seu prejuízo?
Fazendo uma análise das leis, podemos começar pelo disposto no art. 46, II do Código Tributário Nacional, o qual dispõe que "o imposto, de competência da União, sobre produtos industrializados, tem como fato gerador: (…) II – a sua saída dos estabelecimentos a que se refere o parágrafo único do art. 51". O art. 51 referenciado define quem são os contribuintes deste imposto, dentre eles, o industrial. Num primeiro momento, a redação constante no art. 46, II do CTN nos leva até a acreditar que no caso de furtos, roubos, enchentes, estas saídas poderiam sim ser tributadas pelo IPI. No entanto, não podemos nos prender somente a disposição legal ordinária. Temos que nos servir da Carta Magna, pois é ela a lei maior. A Constituição Federal, após dar competência para a União Federal instituir imposto sobre produtos industrializados (art. 153, IV), estabeleceu que o mesmo (art. 153, §3º, II) "será não cumulativo, compensando-se o que for devido em cada operação com o montante cobrado nas anteriores". Ao fazermos a interpretação destes dois dispositivos, tranquilamente chegamos à conclusão que o IPI incide sobre operações e o termo "operação", assim disposto, vai ao encontro de um "negócio jurídico", revestido de todas as formalidades legais, o que, sabemos, não acontece nas operações de caso fortuito ou de força maior.
No roubo, não se aperfeiçoa o negócio jurídico translativo da propriedade, a carga tributária agregada não é transferida para o consumidor, assim como inexiste o valor da operação. A Receita Federal, por sua vez, sempre na sede arrecadatória, passa por cima dos aspectos básico da tributação e exige do contribuinte o imposto nestas operações. Na esfera judicial, felizmente, tal questão vem tomando contornos favoráveis ao contribuinte.
Os Tribunais Regionais Federais não costumam aceitar o pedido das empresas para anular o lançamento do tributo e o Superior Tribunal de Justiça, até pouco tempo atrás, mantinha esse mesmo entendimento. Porém, desde o segundo semestre de 2012, um novo entendimento prevalece na 2ª Turma do Superior Tribunal de Justiça. Por maioria de votos, os ministros decidiram que, em caso de furto ou roubo das mercadorias, não há proveito econômico e, portanto, o tributo não deve ser recolhido.Não bastasse o enorme prejuízo com a perda das mercadorias, com o desfazimento do negócio, ainda assim, o contribuinte ainda tem que tributar o seu prejuízo? Isto não deve prevalecer por absoluta inexistência do fato imponível. É inconstitucional e ilegal
Fonte: Valor